Valdo Barcelos: Paulo Freire, patrono da Educação Brasileira
* Artigo publicado originalmente no espaço Plural, edição impressa do Diário de Santa Maria do dia 14 de fevereiro
Ao aceitar participar da coluna Plural sobre Educação, um tema que me é caro, perguntei-me: por onde começar? Decidi começar pelo patrono da Educação Brasileira e cidadão do mundo Paulo Reglus Neves Freire (1921-1997). No ano de 2021, em que Freire completaria 100 anos se vivo estivesse, foram editados dossiês em revistas acadêmicas no Brasil e no Exterior; promoção de um festival de lives – em tempos de pandemia tudo virou live –; reedições de livros em vários idiomas pelo mundo. Freire está presente desde Angicos, interior de Pernambuco, passando por Berlim, Caicó, Tóquio, Porto Alegre, Nova York, Genebra, Toulouse, Recife, Lisboa, Rio de Janeiro, Hamburgo, Vitória, Bogotá, e por aí vai.
Deixo quatro perguntas bem simples para tentar entender esse Brasil profundo: (1) O que leva Paulo Freire a ser estudado e pesquisado nas mais prestigiosas universidades do mundo onde, muitos professores (as) brasileiros (as) adoram ir fazer doutorado e pós-doutorado e voltar ao Brasil para seguir colocando “poréns” em textos estrangeiros? (2) Como explicar esse Freire que também é estudado nos confins do Brasil em universidades privadas onde estudam pessoas que trabalham de dia e usam grande parte do salário que ganham para pagar a mensalidade de seu curso noturno? (3) Como entender que Freire seja adotado em escolas privadas de bairros ricos de grandes cidades como São Paulo, onde estudam os filhos da elite brasileira? (4) Como interpretar o fato de que colegas professores (as) da educação básica de escolas púbicas da periferia busquem em Freire forças para continuar exercendo essa profissão que alguns burocratas “iluminados” descobriram, na pandemia da Covid-19, que a educação é uma atividade essencial?
Existem, também, aqueles (as) que justificam não adotarem ideias freireanas por medo de perseguição. Digo a eles (as) que fiquem tranquilos. Se admiram, sinceramente, o velho Mestre, não há o que temer. Freire sempre encarou de cara limpa e olhar manso, mas, corajoso, àqueles (as) que o atacavam, até mesmo os mandaletes e biltres da ditadura, Freire enfrentou com altivez. Freire era um contador de histórias. Vamos a uma. O comandante do quartel, no qual Freire estava preso, chamou-o e falou: “Senhor Paulo Freire, sei que é um grande alfabetizador de pessoas adultas. Tenho muitos soldados analfabetos, quero que o senhor os ensine a ler e a escrever”. Freire coçou a barba, pensou e deu o troco ao entojado comandante: “Mas, comandante, é por fazer justamente o que estás me pedindo que vocês me prenderam”. O comandante ficou sem resposta, chamou um soldado e lhe mandou de volta para a cela.
Valdo Barcelos é professor da UFSM e escritor