Diário de Santa Maria: Falta de professores atinge mais da metade das escolas municipais de Santa Maria
Faltam professores e respostas na rede municipal de ensino. A animação e expectativa pelo retorno das aulas presenciais, no dia 19 de fevereiro, esbarrou na dura realidade das escolas da rede municipal de Santa Maria. A ausência de profissionais em mais da metade das instituições faz com que estudantes ainda permaneçam em casa ou fiquem sem conteúdos básicos, como matemática ou português. Há ainda casos em que os alunos são liberados na metade do turno, já que não há quem possa ficar com eles até o fim do período.
Em levantamento do Diário com as 75 escolas municipais de Ensino Infantil e Fundamental da rede municipal, apenas 13 disseram estar com o quadro completo de funcionários. Nas demais, há falta de profissionais, o que prejudica a vida dos centenas de alunos. Ao todo, a defasagem de professores é de pelo menos 128. Outras 21 instituições não quiseram se manifestar ou não atenderam as ligações da reportagem de 2 a 4 de março.
O Sindicato de Professores Municipais de Santa Maria (Sinprosm) classifica o início do ano letivo como vergonhoso e acusa a Secretaria Municipal de Educação (Smed) de morosidade no processo de contratação de profissionais. O Sindicato também critica a falta de respostas do poder público.
– As direções fazem malabarismo dentro das escolas. Em um ou dois dias, até dá para se organizar com isso. O problema é não ter uma previsibilidade de quando terão as demandas atendidas. É uma vergonha o início do ano letivo nas escolas municipais de Santa Maria – disse o coordenador de Comunicação e Formação Sindical do Simprosm, Rafael Torres.
SEM ESTIMATIVA
A prefeitura não divulgou, desde o retorno presencial, o número da defasagem de professores na rede. Na sexta-feira, a secretária de Educação, Lúcia Madruga, preferiu não se manifestar sobre o tema. O Executivo enviou uma nota ao Diário (veja na próxima página), em que justifica que “o número que retrata a defasagem oscila muito, tornando-se difícil uma estimativa mais precisa”. A prefeitura também alega que mais professores são nomeados diariamente e que existem trâmites legais que podem estender o processo em até 45 dias.
De acordo com Torres, a prefeitura tem conhecimento da defasagem de profissionais desde dezembro do ano passado, quando as escolas encaminharam ao Executivo a relação das demandas para o ano de 2022. A versão é reforçada por diretores.
– As crianças mereciam que tudo tivesse organizado lá no dia 23 de fevereiro. Isso teria que ter sido organizado antes. A gente entende a espera pelas instruções normativas e a falta de funcionários para recursos humanos, mas isso vem desde 7 de dezembro, quando entregamos a lista de tudo o que precisávamos para iniciar o ano letivo. Perderam (o município) tempo e se desorganizaram em um momento que não poderiam – relata Andreia Schorn, diretora da Escola Municipal de Ensino Fundamental Sérgio Lopes.
No caso dessa, alguns professores foram viabilizados entre a última quinta e sexta-feira, o que fez o cenário melhorar. Conforme Andreia, a liberação ocorreu após diversas ligações para Smed. O retorno foi positivo para mais dois professores e a liberação de regime suplementar de trabalho para outro. Atualmente, a instituição ainda aguarda um professor de História e um de Educação Especial.
Os relatos de problemas se espalham por toda a rede municipal. Na Escola Leduvina da Rosa Rossi, a diretora precisa abandonar as funções administrativas para cuidar dos pequenos. Na Escola Fontoura Ilha, a defasagem é de 10 profissionais e cerca de 20 alunos do 5º ano estão em casa. Caso não haja reposição, o plano será liberar uma turma a cada dia da semana. Na Escola Pão dos Pobres, faltam quatro professores, e a alternativa será liberar estudantes a partir da semana que vem. Na Escola Duque de Caxias, estudantes estão indo para casa às 10h30min, pois não há quem fique com eles em todo o período. Na Escola Reverendo Alfredo Winderlich, faltam professores de áreas básicas, como matemática, ciências e português. Na Educação Infantil, o que preocupa é o baixo número de estagiários. Os relatos são semelhantes nas 41 escolas que alegaram ter algum tipo de defasagem no quadro de funcionários. O problema se dá em relação a novos profissionais e também na aprovação de regime suplementar de trabalho para professores que já estão na rede municipal.
– Visitei várias escolas no início do ano letivo, na quarta-feira passada (19 de fevereiro). Da minha observação, a questão dos professores é algo pontual e não é generalizado em todas as escolas. É um processo permanente. Todos os dias estamos enviando professores e solucionando cada uma dessas situações. Minha avaliação na semana passada foi de muita tranquilidade por parte das escolas – disse a secretária de Educação, Lúcia Madruga, em entrevista à Rádio CDN na manhã de quinta-feira.
MAIS DA METADE DAS ESCOLAS SEM PROFESSORES
Das 80 escolas municipais que constam no site da prefeitura de Santa Maria, o Diário contatou 75 entre quarta e sexta-feira. Todas as escolas de Educação Infantil e de Ensino Fundamental foram contabilizadas. Não estão no levantamento a Escola de Artes, a Escola Municipal de Aprendizagem Industrial (EMAI) e outras três escolas conveniadas.
Das 75 escolas contatadas por telefone, 21 não atenderam ou não quiseram se manifestar. Outras 41 relataram alguma defasagem no quadro de profissionais, isto é, 54,6% das escolas sofrem a falta de professores. Apenas 13 disseram estar com quadro suficiente.
A soma da defasagem de professores entre as 41 escolas que relataram algum tipo de problema é 128. Inclui-se no dado o total de falta de profissionais contratados e a necessidade de professores por meio de regime suplementar de trabalho, entre profissionais que já integram a rede.
O LEVANTAMENTO
- 75 escolas no total
- 54,6 % de escolas com falta de professor
- 128 professores em falta no total*
“É LAMENTÁVEL QUE O PROCESSO SEJA FOLHA A FOLHA”
O Sindicato dos Professores Municipais de Santa Maria (Simprosm) responsabiliza a Secretaria Municipal de Educação (Smed) pelo problema da falta de professores em mais da metade das escolas da rede. Para o coordenador de Comunicação e Formação Sindical, Rafael Torres, o problema tem se tornado crônico e não há perspectiva de uma solução a curto prazo.
– O grande problema é o processo burocrático para colocar os profissionais em sala de aula. Temos a Secretaria de Educação, que é responsável por esses processos, e isso está demorando uma eternidade. Nós já alertamos que há uma falta de estrutura. A prefeitura não fornece a estrutura adequada para dar conta de uma demanda tão grande. Esses processos precisam ser informatizados, ter uma celeridade maior. Isso tudo foi encaminhado pelas escolas no final do ano anterior. Não é admissível que estejamos em março ainda sem uma previsão de ser sanado esse problema – argumenta.
No dia 23 de fevereiro, a entidade havia estimado parcialmente a falta de 65 profissionais, em levantamento feito com cerca de 60% das escolas. Mas Torres concorda que esse número é maior na realidade. O sindicato também critica a falta de estrutura da Smed para dar conta da demanda das contratações para a rede municipal:
– É lamentável que o processo seja feito folha por folha em uma estrutura enorme como é a da Educação. É o que acontece na Secretaria de Educação. Não há uma integração, um sistema junto às escolas. Isso sobrecarrega os profissionais que lá estão.
A prefeitura se manifestou por meio de nota, enviada ao Diário no começo da tarde de sexta-feira. No texto (confira a íntegra abaixo), o Executivo afirmou que a Educação é tratada como prioridade e que está ciente da situação. A demora na reposição é explicada pela prefeitura pelos trâmites legais necessários para repor o quadro de professores.
NA EDUCAÇÃO INFANTIL FALTAM ESTAGIÁRIOS
Para que sejam atendidos os 105 alunos da Escola Municipal de Ensino Infantil (EMEI) Ida Fiori Druck são necessários seis professores e dois estagiários. Porém, o ano letivo e o esperado retorno das aulas presenciais esbarrou na falta de profissionais. A instituição ainda aguarda pela chegada de dois professores e, embora processos de contratação já estejam encaminhados, não há estagiários. Para que não haja suspensão de turmas e nenhuma criança fique sem aula, a direção se desdobra para encaixar horários e repor profissionais que acabam acumulando funções.
– Nossa comunidade está feliz, e as crianças estão retornando. Estamos tomando cuidados com o distanciamento e o uso máscara, mas estamos com falta de professores. Nosso quadro não está completo. A direção e a coordenação acabam indo para sala de aula, e não é o primeiro ano que acontece. Ainda estamos no período de adaptação e aguardando que a prefeitura nos envie esses profissionais. Sou diretora e resolvo desde a atualização do alvará até os horários e o quadro funcional. Quando falta professor, vou para sala de aula. O que não queremos é que as crianças não tenham aula – conta a diretora Adriana Turtiello Maia .
A Ida Fiori Druck não é uma realidade isolada. Das 21 escolas de Educação Infantil, nove sofrem com a falta de profissionais. Segundo levantamento do Diário, ao todo, faltam 19 professores e 34 estagiários.
A rotina de uma escola de Educação Infantil (EI)requer tarefas diferenciadas. As atividades não são separadas por disciplinas e têm como base a unidocência, isto é, um professor por turma. Mas, quanto menor a faixa etária, mais é preciso de monitores ou estagiários para acompanhar os alunos. O aprendizado é desenvolvido a partir de brincadeiras. Práticas simples como hábitos de higiene e alimentação buscam valorizar a interação entre os pequenos e com os adultos.
– Uma só professora não dá conta. Por isso, precisamos de estagiários dependendo a idade. dos alunos. Há uma preocupação dos pais, que nos procuram muito questionando a falta de professores. Até adaptamos com uma professora e depois outra substitui. Mas fica essa angústia de conhecer e saber qual vai ficar na escola, porém essa é uma resposta que não temos como dar. A gente tenta se desdobrar e e cobrir profissionais, mas o ideal é ficar com aquela profe que vai acompanhar o aluno todo o ano – completa a diretora.
A Educação Infantil abrange a faixa etária de zero a 5 anos. Em geral, no berçário, ficam alunos de até 2 anos; no maternal 1, de 2 anos; no maternal 2, de 3 anos, no pré-A de 4 anos e no pré-B, de 5 anos.
- Total de escolas – 21
- Professores em falta – 19
- Estagiários em falta – 24
A NOTA DA PREFEITURA
A prefeitura de Santa Maria, por meio do setor de Gestão de Pessoas da Secretaria Municipal de Educação (Smed), esclarece que mantém um fluxo constante de reposição de professores e servidores nas escolas da Rede Municipal de Ensino – cabe lembrar que se trata de um universo de 80 escolas, quase 2 mil servidores e mais de 20 mil alunos.
Sendo assim, são encaminhados, diariamente, às escolas, professores nomeados nos editais já publicados ou em processo de publicação. Já são mais de 650 professores aprovados em concurso público nomeados para atuar nas escolas da rede desde o início da gestão do prefeito Jorge Pozzobom. Portanto, o número que retrata a defasagem oscila muito, tornando-se difícil uma estimativa mais precisa.
No entanto, há trâmites legais que precisam ser respeitados até que os professores chamados para compor o quadro se apresentem e, efetivamente, comecem as suas atividades em sala de aula. Pelo Regime Jurídico Único do Município, há um prazo de 15 dias, podendo ser estendido por mais 15 dias a pedido do próprio candidato aprovado em concurso e nomeado em edital, para que ele se apresente à prefeitura. Além disso, há outro prazo de mais 15 dias até que o professor entre em exercício, o que pode somar 45 dias de espera.
O Executivo ressalta que trata a Educação como prioridade, é ciente dessa situação e trabalha de forma a equacionar a reposição de professores dentro de suas possibilidades legais.