Diário de Santa Maria: Com previsão de retorno a partir de segunda, nem todas escolas têm como receber todos alunos
As escolas de todo o Rio Grande do Sul chegam neste final de semana com a ideia de que o ensino híbrido ficará para trás na rede básica de educação. Mas, na prática, pouco coisa deve mudar, e as aulas remotas devem continuar, mesmo com a obrigatoriedade do retorno das atividades presenciais a partir de um decreto estadual.
A decisão do governo do Estado, que prevê o retorno obrigatório das aulas presenciais, é controversa e gerou opiniões contrárias de diversos setores. Para o coordenador de comunicação do Sindicato dos Professores Municipais de Santa Maria (Sinprosm), Rafael Torres, o decreto atrapalha muito e não traz ganhos. Ele falou ao CDN Entrevista na sexta-feira:
-Faltando praticamente 30 dias letivos para o final do ano, qual o ganho pedagógico disso? Frente a todo o contexto que estudantes, professores e comunidades escolares vêm enfrentando nos dois últimos anos, pensamos que é intempestivo e inconveniente a forma com que foi feito esse decreto, impondo e não dando a menor possibilidade das escolas das redes pública e privada se organizarem de acordo com a sua realidade – afirmou Torres.
REALIDADES
As escolas bem que tentaram se preparar para seguir o decreto estadual, mas questões sanitárias, como o distanciamento de um metro entre as classes nas salas de aulas, impedem que turmas de 25 alunos, por exemplo, consiga frequentar o mesmo espaço.
Com essa restrição, a Escola Estadual de Ensino Fundamental Marieta D’Ambrósio consegue comportar 13 alunos simultaneamente na maior sala de aula que dispõe. No total, são cerca de 477 alunos que, mesmo com a obrigatoriedade do retorno, ainda vão continuar no modelo escalonado feito com grupos de estudantes.
-Desde agosto passado, já estamos trabalhando dessa maneira, com grupo A e B, e vamos continuar até o final do ano letivo de 2021 assim. Em respeito às normas do protocolo de segurança e porque não temos como colocar todos os alunos de uma turma numa mesma sala de aula – afirma a diretora, Tania Paim.
O Instituto Estadual de Educação Olavo Bilac registra duas realidades diferentes entre os níveis de ensino. Conforme o vice-diretor do Ensino Médio, José Ronay Carlos da Silva, só será possível identificar quais serão as dificuldades a partir do retorno. Segundo ele, o prédio principal da escola consegue comportar todos os alunos, além de ser bem ventilado:
-Até hoje, não foi preciso fazer revezamento, mas este número real ainda vamos saber a partir desta segunda. O que conta a nosso favor é que nossas salas são amplas. Acredito que conseguimos receber entre 20 e 22 estudantes por sala.
Ainda segundo Ronay, a escola tem recebido ligações de alunos que começaram a trabalhar durante a pandemia e vão precisar pedir transferência para outra instituição. Entre os três anos do Ensino Médio, o primeiro e segundo são os que mais haviam retornado ao presencial até então, com cerca de 50% dos alunos.
Já com as turmas do Ensino Fundamental, a situação é outra. As salas de aula do prédio anexo do Olavo Bilac são menores e será preciso o revezamento, o que já ocorre nas turmas do 1º e do 5º ano.
-Vamos fazer o levantamento para depois estabelecer como será o trabalho presencial para todos – diz a vice-diretora dos anos iniciais, Vera Lígia Medeiros.
Na última quarta-feira, quando o Diário foi até a escola, em uma sala de aula onde caberiam 15 alunos, apenas três haviam comparecido.
ESCOLAS EM NOVO CONTEXTO, MAS COM VELHOS PROBLEMAS
Já na Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEF) Dom Luiz Victor Sartori, são os problemas antigos que mais afetam a instituição nesse período de preparativos de retorno. Segundo a diretora da instituição, Maria Edelweis Palma da Costa, há 13 anos, o banheiro feminino da escola está inutilizável. Hoje, ele funciona como depósito, o chão está afundando e a iluminação não funciona.
No banheiro dos professores, a situação também é precária. Uma das caixas de água dos sanitários está caindo e foi necessário prendê-la na parede. O muro que divide as duas cabines tem enormes rachaduras e demonstra estar prestes a ruir.
O banheiro masculino é onde a situação está melhor. Ainda assim, alguns dos vasos não têm tampas, e as portas das cabines precisam de reformas.
Para suprir a falta de banheiros, a Secretaria Municipal de Educação (Smed) instalou três banheiros químicos. Contudo, a decisão não agradou os pais que, segundo a diretora, reclamam frequentemente da medida.
Além disso, dois dos banheiros químicos ficam na pracinha com os brinquedos, e o outro, junto ao estacionamento dos professores. Isso porque eles precisam ficar próximo à rua, pois o caminhão que faz a higienização necessita passar a mangueira por cima do muro até a cabine.
O prédio da escola conta com um portão onde seria possível passar o veículo, mas ele é barrado por uma árvore. A situação pitoresca aconteceu, pois o plano da prefeitura era construir o muro e, então, retirar a árvore. Entretanto, segundo Maria Costa, vizinhos denunciaram a retirada da árvore às autoridades ambientais, e a derrubada foi cancelada. Segundo a diretora, a planta não é nativa e, portanto, não é protegida pela legislação.
Ao ser questionada sobre a escola durante o CDN Entrevista, a secretária de Educação, Lúcia Madruga, afirmou que o projeto de recuperação da escola já está pronto e a caminho da licitação para solucionar em definitivo a questão dos banheiros, mas sem nenhuma data definida. Ela também afirmou que a Smed está montando uma equipe com engenheiros elétricos e civis e arquitetos para o desenvolvimento de projetos similares em outras escolas da rede municipal.
Para a diretora da Dom Luiz Victor Sartori, a situação precária afeta diretamente o ensino que é dado aos alunos.
-Não somos atendidos como nós deveríamos ser, e como os alunos merecem ter uma escola de qualidade. Assim como sempre estamos pedindo para que tenha um ensino de qualidade. A quantidade é boa, mas o que vale é a qualidade em todos os sentidos. Então nós, professores, eu acho que não merecemos viver numa situação dessas – completou Maria.
NA REDE PARTICULAR, DECRETO FOI ACEITO COM TRANQUILIDADE
No Colégio Pallotti Antônio Alves Ramos, o decreto do Estado foi recebido com certa tranquilidade. Isso porque a maioria dos alunos já está no formato presencial/híbrido. A vice-diretora Geonice Hauschildt garante que a escola consegue, dentro do teto de ocupação, atender a todos os alunos matriculados. Ela lembra que os casos de estudantes com comorbidade serão tratados diretamente com as famílias.
-O aprendizado em sala de aula é outro, e sabemos o quanto a educação é importante, assim como a sociabilidade que esses estudantes precisam – comenta Geonice.
Da mesma forma se encontra o Colégio Franciscano Sant’Anna, em que apenas um pequeno grupo de alunos permanece no ensino remoto. Na escola, aqueles estudantes que, por comorbidade ou atestado médico continuarem no sistema virtual, assistirão às aulas de modo síncrono aos colegas que estão no colégio, conforme a vice-diretora, Helena Rode.
Segundo pesquisa realizada pelo Sindicato do Ensino Privado do Rio Grande do Sul (Sinepe/RS), realizada ainda em setembro com 96 instituições de ensino, 28% das escolas não podiam receber todos os alunos em sala de aula em função da regra do distanciamento. Outra pesquisa feita pela entidade, em agosto, com 142 instituições, apontou que 22,7% dos estudantes ainda permaneciam no ensino remoto. Destes, 72,1% era por opção dos pais, outros 17,7% por comorbidade, 6,8% não especificaram o motivo e 3,4% não responderam à questão.
NEM TODOS OS PROFESSORES ESTÃO COM A VACINAÇÃO COMPLETA CONTRA A COVID-19
Durante a participação no CDN Entrevista, na sexta-feira, a secretária de Educação de Santa Maria, Lúcia Madruga, afirmou que a pasta está ciente de casos de alguns professores que ainda não receberam a vacina por opção própria. Nestes casos, explica, os professores assinam um termo de responsabilidade.
-A gente tem que deixar claro que o município ofereceu a condição para que essa pessoa fosse vacinada. No caso de haver alguma contaminação pelo vírus, o município tem que se resguardar deste processo, que seja da responsabilidade exclusiva daquela pessoa – afirmou Lúcia.
No mesmo sentido, o coordenador de comunicação do Sinprosm, Rafael Torres, acredita que menos de 1% dos professores da cidade deve ter recusado a vacina. Entre os motivos para o alto índice de adesão à imunização apontados por ele, está a forte movimentação da categoria em prol da vacinação.
– De forma geral, a categoria foi uma das principais que lutou arduamente, pedindo, exigindo a vacinação e fazendo, inclusive, campanha nas escolas. Os professores também incentivaram as comunidades, relatando a importância da vacinação não só para a categoria, mas para a população em geral – afirmou.
A estimativa de Torres também vai ao encontro do que afirmou José Luis Viera Eggres, titular da 8ª Coordenadoria Regional de Educação, de que cerca de 92% dos professores do Estado estão plenamente vacinados. Ainda conforme Eggres, serão 45 dias de aulas presenciais que servirão de reforço à educação:
-A cada dia que o aluno fica fora da escola, são três dias de prejuízos na aprendizagem. Chegou a hora de proporcionar aquilo que é direito do aluno.
Também em entrevista à CDN, a diretora do 2º Núcleo do Cpers/Sindicato, Dgenne Ribeiro, considerou insuficiente este período de um mês e meio para o término do ano letivo e questiona como será feita a recuperação da aprendizagem destes alunos.
-Sabemos do prejuízo pedagógico e não temos como, posteriormente, vamos colocá-los num patamar considerado normal para a idade e desenvolvimento deles – afirmou (Colaborou Gabriel Marques)
O QUE DIZ O DECRETO
Confira as regras que precisam ser seguidas nas instituições de ensino para as atividades presenciais:
- Distanciamento mínimo de 1 metro entre os estudantes. (O novo decreto possibilita que as instituições que não puderem assegurar o distanciamento mínimo devido ao tamanho do espaço físico escolar poderão adotar o sistema de revezamento dos estudantes. Para tanto, deverão assegurar a oferta do ensino remoto naqueles dias e horários em que os alunos não estiverem presencialmente na escola. As equipes gestoras destas instituições de ensino entrarão em contato com suas respectivas comunidades escolares para orientações.)
- Uso obrigatório de máscara
- Higienização constante das mãos
- Ambientes ventilados