CNTE: Reabrir escolas requer vacina para todos e investimentos nas redes públicas de ensino
A inserção do PL 5.595/2020, de autoria das deputadas Paula Belmonte (Cidadania/DF) e Adriana Ventura (Novo/SP), na pauta da Câmara dos Deputados para votação em regime de urgência, revela uma atitude intempestiva e inoportuna do presidente daquela Casa parlamentar, por vários aspectos. E essa postura precisa ser reprovada pelo conjunto dos parlamentares, a fim de preservar o bom senso e o caráter de responsabilidade do Congresso Nacional frente ao combate da pandemia do coronavírus.
Em primeiro lugar, a pauta dessa proposição demonstra a adesão da Câmara dos Deputados ao negacionismo expresso diariamente pelo Governo Federal no enfrentamento da pandemia. Só quem não conhece a realidade da maioria das escolas públicas e/ou quem nega os métodos científicos de combate ao coronavírus com vistas a impedir mais mortes, é capaz de propor ou apoiar o referido projeto de lei. O momento exige isolamento social e ampliação da vacinação para conter o alastramento do vírus. E as duas coisas não estão acontecendo a contento no Brasil, estando a população à mercê da contaminação, com índices cada vez maiores de óbitos decorrentes da covid-19.
Outro fato lamentável: a apreciação da urgência do PL 5.595/20 é pautada para o mesmo dia em que o Senado Federal deverá (por ordem judicial) instalar Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar as ações e omissões do governo Bolsonaro no combate à pandemia. E, caso o presidente Arthur Lira considere sua atitude como estratégica para fortalecer o presidente cambaleante, seria bom atentar-se para o risco de afundar o parlamento na crise institucional, uma vez que estará indubitavelmente corroborando com a má gestão pública para o enfretamento da pandemia.
Sobre a tramitação do projeto, salta aos olhos a antijuridicidade do PL 5.595/20, o qual desconsidera outras legislações que tratam de atividades essenciais do Estado, especialmente a Lei 13.979, que “dispõe sobre as medidas para enfretamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019”, a Lei 7.783/89, que trata sobre “o exercício do direito de greve, define as atividades essenciais, regula o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, e dá outras providências”, além do decreto 10.282/20, que “regulamenta a Lei 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, para definir os serviços públicos e as atividades essenciais”.
O País possui legislações específicas que tratam de atividades essenciais e que não são consideradas pelo PL 5.595/20. E tal situação converge para um cenário de grave antinomia legal. Além, é claro, de atentar contra direitos constitucionais como a greve e o próprio direito à vida! As escolas brasileiras (públicas e privadas) reúnem cerca de 50 milhões de estudantes e mais de 5 milhões de profissionais – cerca de ¼ (um quarto) da população nacional. Somados aos estudantes e trabalhadores do ensino superior, o contingente de pessoas transitando nas cidades será ainda maior, agravando os níveis já elevadíssimos de contaminação e mortes.
Outra incongruência do PL 5.595/20 refere-se à desconsideração da autonomia administrativa, financeira e pedagógica das universidades públicas, recentemente reiterada e enaltecida em julgamentos do Supremo Tribunal Federal. Mais uma razão para que a proposição seja arquivada, sem análise de mérito, dada a precariedade de sua técnica legislativa.
A pretensa salvaguarda inserida na parte final do art. 2º do PL 5.595/20, ressalvando as atividades presenciais nas escolas quando houver restrições fundamentadas em critérios técnicos e científicos devidamente comprovados, de nada adiantará num cenário pandêmico cada vez mais ideologizado e negacionista. Pior: com governos que não atendem às orientações científicas, com órgãos de controle estatal incentivando disputas políticas locais e com decisões judiciais muitas vezes em conflito nas diversas regiões do País. E no meio dessa confusão, as comunidades escolar e universitária não podem ser expostas de maneira tão desproposital.
Também chama a atenção, neste momento, a falta de coerência da Câmara dos Deputados em pautar um projeto que segue na contramão de outro recentemente aprovado pela Casa e pelo Senado. O PL 3.477/20, do deputado Idilvan Alencar e outros, aprovado pelo Congresso e vetado pelo Presidente da República para priorizar o pagamento da dívida pública, “dispõe sobre a garantia de acesso à internet, com fins educacionais, aos alunos e professores da educação básica”. Através desse importante projeto, os estados e municípios receberiam mais de R$ 3,5 bilhões de reais, em 2021, para poderem investir em equipamentos e internet, garantindo o acesso de todos (estudantes e profissionais da educação) em aulas remotas durante a pandemia. E compete ao Congresso Nacional pautar e derrubar com urgência esse veto abominável do presidente Bolsonaro.
Mesmo com a vacinação em massa (situação ainda distante da nossa realidade), já se sabe que o retorno às atividades escolares presenciais deverá ocorrer de forma gradual, e as escolas precisarão ser preparadas para essa nova realidade. Daí a necessidade de mais investimentos! Mas, ao contrário disso, o Governo reduziu os orçamentos da educação e da saúde para este ano de 2021, dificultando ainda mais a realidade de nossas escolas e universidades públicas. O retorno seguro às aulas presenciais também requer ações coordenadas das áreas públicas responsáveis pela educação, saúde e assistência social, à luz da realidade de cada território, a fim de contemplar as diversas exigências e necessidades das populações que acessam a escola pública.
Melhor demonstração de compromisso do parlamento no trato da pandemia seria debater com o Governo e a Sociedade a recomposição do orçamento da educação e da saúde, a derrubada do veto 10/21 e a repristinação do Decreto Legislativo nº 6/2020 e de todas as medidas que dele derivaram. No caso da educação, mesmo com a revogação tácita da Lei 14.040, que estabeleceu normas educacionais excepcionais a serem adotadas durante o estado de calamidade pública, há inúmeras resoluções e pareceres do Conselho Nacional de Educação, anteriores à lei federal, que autorizam as atividades remotas durante a pandemia como forma de preservar vidas. Ainda assim é preciso assegurar mais recursos públicos para a área, conforme previa a Lei 14.040 (com vetos).
Por um Estado verdadeiramente compromissado com o enfrentamento da maior e mais letal pandemia vivida pela população brasileira!
Pelo respeito à vida de crianças, jovens e adultos que não podem ser expostos em momento tão delicado da pandemia em ambientes escolares sabidamente inadequados na maior parte das redes públicas de ensino!
Pela rejeição total do PL 5.595/2020 e outros congêneres!
Pela derrubada integral do veto 10/2021 (PL 3.477/20) e pela recomposição dos orçamentos federais da educação e da saúde!
Por uma escola pública de qualidade, gratuita, democrática, laica e acessível para todos e todas!
Brasília, 13 de abril de 2021
Diretoria da CNTE